AMBIGUIDADES
A mais
recente crise política esteve germinando durante os dois anos do governo
PPD/CDS e acabou por aparecer às claras com a demissão do ministro das
finanças, Victor Gaspar, verdadeiramente um elemento destacado da tróica, que
impôs aos portugueses desfavorecidos uma austeridade criminosa, ultrapassando
mesmo os ditames conhecidos daquela organização tripla+1.
Pois bem,
Victor Gaspar justificou o seu pedido de demissão perante o fracasso total das
suas políticas destruidoras do tecido social, económico e financeiro nacional,
confessou-se incapaz de prosseguir, fugiu a sete pés e deixou evidente a fraca
liderança do governo. Pergunta-se: quem vai ressarcir os portugueses das malfeitorias
perpetradas por este ex-governante e cegamente sustentadas pelo
primeiro-ministro e maioria parlamentar?
A seguir
demitiu-se Paulo Portas declarando que se tratava de uma decisão irrevogável.
Ora subitamente o irrevogável passou a revogável, sob a pressão do
primeiro-ministro, dos media, dos fazedores de opinião e, sobretudo, do
presidente da republica Cavaco Silva. Entretanto, a tremenda manobra, então desencadeada,
não apaga a clara demonstração de falta de carácter de Paulo Portas.
O puzzle
completa-se com a patética intervenção de Cavaco Silva para a salvação do seu
governo e maioria de apoio, em várias fases, a primeira aparentando
desconfiança naqueles, ignora a proposta de remodelação feita com pompa e
circunstância pelo primeiro-ministro e ameaça usar todos os meios jurídico-constitucionais
ao seu dispor para uma solução governativa, deixando subentendida uma
iniciativa pessoal. Na segunda fase, uma revisão desajeitada daquela, quis impor
o comprometimento do PS na conjectura de solução para a salvação nacional,
promovendo reuniões tripartidas PS+PPD+CDS por serem estes os únicos partidos
do arco governamental, isto é, desprezando os outros partidos que representam
cerca de 20% do eleitorado português, numa demonstração cabal da sua pequenez
mental e do seu fundo antidemocrático e ditatorial. A terceira fase é a negação
da primeira, pois dá o aval ao governo recauchutado e preconiza a sua
continuidade até ao fim da legislatura…
Diante de todas
estas manobras antidemocráticas visando a manutenção da maioria e seu governo
qual foi a posição do PS? Depois de ter denunciado publicamente a incompetência
e incapacidade do governo que conduziram ao desastre nacional e de considerar como
única solução para a crise política a realização de eleições legislativas
antecipadas, simultâneamente com as autárquicas, em Setembro, numa lamentável
cambalhota aceita o repto de Cavaco e reúne-se, horas e horas a fio, com os
partidos da coligação que não conduziram a nada porque a pressão exercida pela
opinião publica e por figuras gradas do seu partido, o secretário-geral do PS,
viu-se coagido a rejeitar as medidas agravadoras da situação social e económica
do país propostas pelos seus companheiros privilegiados de diálogo. A bem da
verdade convém referir a exigência prévia do PS de que todos os partidos fossem
ouvidos, o que se perdeu logo a seguir sem qualquer reacção.
Infelizmente
a ambiguidade da direcção do PS, jogando com um pau de dois bicos, não é de agora,
tem dezenas de anos e tem contribuído, dentro ou fora do governo, para o estado
actual do país, dos portugueses. Não é possível, ao mesmo tempo, estar de bem
com deus e com o diabo, é imperativo escolher inequivocamente de que lado se
está, isto é, considerando-se o PS um partido de esquerda como explicar que as
suas alianças tenham sido sempre com a direita? Partindo daquele princípio
ideológico, como aceita o PS a sistemática discriminação do presidente da
república em relação ao PCP e BE, desde a constituição do Conselho de Estado à injustificável
exclusão do chamado arco governamental? Porque é que rejeita a discussão, com
os outros partidos de esquerda, dos problemas do país com vista à sua solução, sem
risco de perda da sua identidade político-ideológica e sem obrigatórias implicações
governamentais, quando está sempre disponível para reunir com a direita? A
situação do país não é ainda suficientemente demonstrativa de que é preciso
mudar de rumo? Estou convencido de que não comunga das opiniões do CDS,
particularmente do seu chefe de bancada e do eurodeputado Nuno Melo, que,
quando em diálogo parlamentar com o PCP, ao não terem mais argumentos, a propósito
de tudo e de nada, logo invocam a União Soviética e os gulagues, à boa maneira
do estado velho salazarento.
O PS como partido de esquerda, que o é na sua
essência, é tempo de deixar a ambiguidade que só o prejudica e aos portugueses
e beneficia a direita, nomeadamente aquela que nos (des) governa e que quer
agravar ainda mais as desigualdades em proveito de uma minoria insaciável que
não respeita os direitos adquiridos após o 25 de Abril, nem sequer os
compromissos assumidos pelo Estado com os pensionistas e reformados