domingo, 30 de setembro de 2012

O DUALISMO E O NUCLEAR


De vez em quando reaparece nos media a pregação dualista dos bons e dos maus, baseada numa escolha sectária e, por isso, cega, mas intencionalmente manipuladora.
Embora seja antigo o dictat da separação entre bons e maus, foi no «reinado» de Ronald Reagan nos EUA que assumiu acinte a dicotomia, de que é exemplo, porque nos (a angolanos e portugueses) tocou na pele, o Savimbi e a UNITA como símbolo do bem, em oposição ao mal personificado em Agostinho Neto e MPLA. De facto, a vivência do período post-independência e, particularmente, na sequência das eleições de 1992 até 2 de Fevereiro de 2002, demonstrou, à saciedade, o quanto o dualismo reaganiano foi «benéfico» para Angola, para os angolanos e para os portugueses.
Presentemente, retorna à baila o risco da bomba nuclear, tão bem defendido através do boneco apresentado pelo pacifista primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu (com y ou com i, não é relevante), anteontem na ONU. Netanyahu alertou para o perigo de o Irão estar desenvolvendo tecnologia que lhe possibilitará produzir a dita bomba, ameaçando intervir militarmente neste país, mesmo sem a ajuda dos EUA. Contudo, as várias inspecções levadas a cabo pela ONU no Irão nunca detectaram, indícios sequer, de que a investigação iraniana se orientasse para tal fim.
A propósito, uma ressalva para que se não infira apoio ao Irão, mas antes por uma questão de princípio de equidade e pela denúncia da hipocrisia dualista.
Esta estória do armamento nuclear é o paradigma do dualismo implantado paulatinamente no mundo ocidental (ainda haverá, politicamente, o mundo oriental?) que nos deve «obrigar» a reflectir demoradamente, pois está em causa a sobrevivência da humanidade.
Com já não se põe em causa, por razões óbvias, a Rússia e a China, considera-se que é inadmissível a possibilidade de o Irão vir a dispor de armamento nuclear, bem como a Coreia do Norte embora, neste caso, seja quase firme a certeza de que já o possui. Entretanto, são já detentores deste tipo de armas de destruição maciça a Índia, o Paquistão e, há muito tempo, Israel, para além dos EUA e da França o que não merece qualquer reparo ou, muito menos, admoestação.
Para todos nós terráqueos o que está estabelecido e imorredouro é um grupo dos bons portadores de tal armamento, dos quais por isso mesmo nunca se fala porque não constituem uma ameaça para o mundo livre e o grupo dos maus, o perigo máximo, objecto de contínua contestação. Além deste dois grupos e sem definição precisa, está a Rússia, já dominada pelo neo-capitalismo e seus valores consumistas, embora se mantenha orgulhosa do seu passado
Terminando, aquilo que está em causa é todo o armamento nuclear, seja qual fôr o seu detentor, uma ameaça permanente para a humanidade, ameaça reforçada pelo dualismo da avaliação sujeita aos ditames dos que dominam o planeta. Defender este princípio é, de imediato, rotulado de pacifismo gratuito e inconsequente, mas a realidade, com os riscos inerentes, é incontestável.

terça-feira, 25 de setembro de 2012

MUDAR É PRECISO

Ontem e hoje ouvi, incrédulo, as duas notícias que a seguir transcrevo:
A primeira diz respeito a uma intervenção do secretário-geral da UGT, João Proença, na qual aconselhava o governo a justificar adequadamente a redução parcial dos subsídios de Natal e de Férias, sob pena de ser considerada inconstitucional e, ao mesmo tempo, afirmou estar certo de que o governo irá restituir a quase totalidade dos subsídios retidos.
A segunda é a satisfação do secretário-geral do PS, António José Seguro, por o primeiro-ministro ter deixado cair a proposta de TSU que sobrecarregava em 7% os trabalhadores e beneficiava, na mesma proporção, os patrões.
No que se refere à primeira notícia é relevante a zelosa preocupação de João Proença ao dar conselhos ao governo, acrescidos da contribuição propagandística numa alegada, hipotética, não confirmada, restituição da quase totalidade dos subsídios retirados aos trabalhadores da função publica e pensionistas. É estranho este comportamento para o líder de uma organização sindical, mais parecendo tratar-se de uma entidade governamental ou talvez não, estará numa linha de coerência que deu cobertura às gravosas alterações à legislação laboral, na chamada concertação social, e com a qual o presidente da republica, o primeiro-ministro, os ministros das finanças, e da economia, o eurodeputado Nuno Melo e a troika, enchem tanto a boca para, despudoradamente, alegar que há paz social no país.
Relativamente à segunda notícia põe-se a questão: o único motivo de preocupação, de revoltam demonstrada nas grandes manifestações de 15 e 22 de Setembro p.p. e o profundo mal-estar existente na nossa sociedade era a TSU? Não, não foi nem é o único, foi e é sim toda a política, numa base ideológica ultraliberal, levada a cabo por este governo que conduziu ao empobrecimento galopante e à desesperança dos portugueses num futuro melhor. Esta manifestação de júbilo do secretário-geral do PS significará que o partido já não chumbará o orçamento para 2013 e caiu também a intenção de apresentar uma moção de censura ao governo? Esta possibilidade é muito preocupante mas espero, sinceramente, que não, pois que está à vista a manobra governamental e dos seus apaniguados de intensificar a desastrosa política contra quem trabalha, em favor das empresas, depois de um aparente e estratégico recuo com a TSU, cujos malefícios transitam para outras rubricas
Por último, a necessidade imperiosa de mudança política, da reconciliação nacional, carece da contribuição do PCP, do BE, do PS e dos muitos democratas certamente prontos para tal, PS que deverá assumir-se finalmente e de uma vez por todas como um partido de esquerda rejeitando, sem ambiguidades, a governação actual que tão mal tem feito ao povo de Portugal.

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

ATÉ ONDE NOS LEVARIA ESTA GENTE, SE PUDESSE


A actual crise política criada por Paulo Portas, procurando despudoradamente sacudir a água do capote, na sequência da maciça contestação popular contra toda a política e não apenas à miserável TSU arquitectada pelo ministro das finanças e pelo Moedas (este minúsculo secretário de estado faz jus ao nome…), deste governo PSD/CDS, manifestação que ultrapassou todas as previsões dos media e dos comentadores/profetas/opinadores/politólogos.
Os políticos que suportam esta maioria não olham a meios para justificar os actos ignóbeis dos seus governantes. Um caso paradigmático é o de um jovem turco do partido de Portas, deputado europeu, Nuno Melo de nome, arrogante e mal educado que se atirou, como gato a bofe, contra o Tribunal Constitucional por esta entidade ter considerado inconstitucional a supressão dos 13º e 14º meses de ordenado dos funcionários públicos e pensionistas, decisão que, na sua opinião pôs em causa a aplicação integral da política terrorista do governo!!! Para este demagogo que está sempre a encher a boca de democracia, atira-se aos partidos de esquerda, particularmente o PCP, com o mesmo ódio dos salazarentos e execra a actual Constituição da República, um empecilho, tal como o é, e sempre foi, o 25 de Abril de 1974.
Vem a propósito trazer à colação o inadmissível, certamente inconstitucional, esbulho cometido pelo ministro das finanças aos pensionistas e reformados que andaram a descontar mensalmente uma parte dos seus ordenados, durante dezenas de anos, para que o Estado, supostamente pessoa de bem, garantisse as suas futuras pensões e reformas. O primeiro-ministro e os ministros das finanças e da economia deste governo provaram não ser pessoas de bem, pois não respeitam os direitos adquiridos que deviam ser garantidos. Atacar as pensões e reformas é um verdadeiro acto de pirataria, de gente sem escrúpulos
Até onde esta gente(?) nos levaria, se pudesse. É vital estar-se atentos, prosseguindo a luta por melhores condições de vida que foram reclamadas nas grandes manifestações de 15 e 21 de Setembro p.p.

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

AFINAL NADA SE PASSOU


No passado dia 15 de Setembro, um «reduzido grupo» de 1.000.000 de portugueses, provavelmente muitos mais, saiu à rua em várias cidades do país, gritando com raiva contra as políticas do governo actual que os tem empobrecido aceleradamente, forçando muitos, que antes pertenciam à chamada classe média, para o recurso à sopa dos pobres. O desemprego galopante, que já terá atingido perto dos 20% dos portugueses no activo e continua a crescer, dos quais cerca de 35% são jovens, muitos deles licenciados, é um flagelo indesmentível que tem destroçado famílias o que conduz à sua insegurança interna e da sociedade nacional.
Recordo, a propósito, que o senhor primeiro-ministro, numa das suas desgraçadas intervenções públicas (o que dirá ele em privado?), afirmou que o desemprego é uma oportunidade de vida e, entretanto, incentivou os portugueses à emigração. Em reforço do aprofundamento ideológico ultraliberal, dele e seus comparsas, sempre contra os trabalhadores e a favor do patronato, alterou nesse sentido a legislação laboral, reduziu os salários, sonegou os 13º e 14º meses de ordenado dos funcionários públicos e pensionistas, em oposição arrogante ao parecer do Tribunal Constitucional, e outras medidas mais ou menos gravosas para a maioria, culminando com a proposta de TSU que agrava os impostos de quem trabalha em 7% e reduz, na mesma percentagem, a carga fiscal das empresas, proposta que, perante tal enormidade ofensiva, foi liminarmente rejeitada pelos representantes das confederações patronais e postas em causa pelo parceiro da coligação, o CDS.
O evidente mal-estar neste governo de direita, espoletado oportunísticamente pelo líder do CDS, é um sintoma inequívoco da fragilidade da coligação e revela, contradizendo as afirmações de circunstância, que para o CDS os interesses do partido e sobretudo do seu presidente, estão acima dos do país.
Incentivados pelo presidente Cavaco lá se reuniram ontem os representantes dos dois partidos, sem os respectivos chefes, e deram à luz um extenso comunicado em duas páginas, pré-cozinhado, pois o tempo de reunião e o número de participantes (10, 11) não o permitiria de outro modo.
Com base naquele comunicado surgiu intempestivamente, porque antes da reunião do Conselho de Estado, o presidente Cavaco anunciando que a tranquilidade regressou, está tudo em ordem, os portugueses podem dormir descansados!!!! Este homenzinho continua, como era de esperar, a ter intervenção despropositada e néscia, demonstrando uma vez mais que a sua eleição foi um lamentável equívoco.
Tudo aquilo que se viu e ouviu nas manifestações de 15/9 que não se limitou à repulsa pela desejada TSU do primeiro-ministro e do ministro das finanças, ao contrário do que muitos apoiantes claros ou sub-reptícios do governo, querem fazer crer, mas sim à globalidade das políticas desastrosas impostas.
Para Cavaco nada se passou de significativo no dia 15 de Setembro, vira o disco e toca a banda….

terça-feira, 18 de setembro de 2012

TONET E O GRAU DE ALFABETIZAÇÃO EM ANGOLA EM 1975



O cidadão angolano William Tonet que terá sido prisioneiro em S. Nicolau, surge indignado a repreender José Eduardo dos Santos pelo discurso proferido em Julho p.p., no qual se terá atrevido a afirmar que em 1975 apenas 2 em 100 angolanos negros sabiam ler e escrever.
Que idade tem William Tonet? Admita-se que cerca de 60 anos e, por isso, em 1975 teria 23, 24, ou 25 anos de vida. Ora ele enfurecido abespinha-se com a grave inexactidão dos  2 em 100, mas eu pergunto-lhe que tal se fosse dito 5 ou 10 em 100, mesmo assim achava excessiva a penalização do regime colonial? Este senhor esqueceu-se ou, por alguma razão especial teve de viver noutro mundo, do que se passava em Angola antes de 1961, isto é, antes da deflagração da Guerra Colonial. Ora o senhor Tonet utiliza os relatórios dos governantes coloniais de depois de Fevereiro de 1961 para tentar «desmontar» a afirmação de JES.
Deixe que lembre de alguma da realidade sobre o tema que eu, actualmente com 75 anos de idade, vivi nos anos 40 e 50:

a)     A quando da preparação do início do ano lectivo, eram abertas as inscrições nas escolas e em muitas delas, senão quase todas, estavam «cheias» para os miúdos das sanzalas, negros na sua totalidade, «aconselhando» os pais a irem na missão. Um aparte para dizer que, na realidade, as escolas públicas não estavam cheias. A este «favorecimento» atente-se ao esforço tremendo de alguns destes pais, com rendimentos miseráveis, para que os filhos aprendessem a ler e escrever, acabando, a maioria deles, por desistir desse desiderato.
b)     Até 61, em Angola apenas havia dois liceus, um em Luanda, o Liceu Salvador Correia e outro no Lubango, Sá da Bandeira ao tempo, o Liceu Diogo Cão. Neste último, entre 1950 e 1955, anos durante os quais estudei neste Liceu, havia mais de 600 estudantes, dos quais menos de 2% eram não brancos. À época, a maioria dos negros que se via nesta cidade de brancos eram os muhuílas, vivendo em condições sub-humanas ou então eram os criados dos brancos. No Salvador Correia a desproporção não era tão obscena, numa cidade onde começava a existir algum poder reivindicativo com o crescimento de uma pequena burguesia mestiça e negra. Em todas as outras cidades apenas existiam colégios privados, cujo custo de frequência, obviamente, não estava ao alcance dos pobres, sobretudo dos negros.
c)    Perante esta realidade pergunta-se, os negros que sabiam ler e escrever nesta época, seriam 2% de uma população negra de cerca de 5 milhões, isto é, haviam cerca de 100.000 letrados?
d)     Ora, em 1961, depois do início da Guerra Colonial, Angola foi redescoberta e aquela situação alterou-se significativamente, embora no princípio, através de medidas de cosmética, retratadas no Selo de Povoamento. Posteriormente, sob a pressão das populações, nomeadamente da branca, o processo evolutivo acentuou-se e até mesmo os negros beneficiaram dele, sobretudo nas cidades, em particular em Luanda. A partir de então, paulatinamente, multiplicaram-se as escolas primárias sem discriminação racial, todas as cidades passaram a ter liceus e até surgiram, «para inglês ver» em 1963 os Estudos Gerais Universitários, inicialmente confinados a Luanda que, contrariando os propósitos do governo português de então, se foram autonomizando, espalhando-se por várias cidades e adquirindo prestígio internacional.
e)     Voltando ao princípio, subsiste a dúvida de quantos negros em 100, sabendo ler e escrever, existiam em 1975 em Angola? Já seriam 5 ou mesmo 10%? E se eram, a situação era ou não grave, como consequência do regime em vigor até à independência?